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Foto do escritorCarl.Aventura

Neve das Neves

A primeira vez que vi neve teria uns 10 ou 11 anos. O meu pai acordou-me, ainda de madrugada, e disse-me para pôr uma manta pelas costas e vir á janela. Estava a nevar. Foi a única vez que nevou na aldeia de Montalvo no Ribatejo. Um acaso do Inverno, que nunca se engana, e me deu a honra de viver um momento único e que me pareceu estranhamente familiar. Voltei a vê-la mais tarde na Serra da Estrela de visita, depois ainda mais tarde quando morei nos estados americanos de Filadélfia e Michigan. Até á data de hoje a neve está presente nas melhores recordações e vivência que tive. A neve que não é mais que água gelada, transforma qualquer paisagem num mundo mágico. Passear ao Sol com um copo de café de sabor a amêndoa ao longo de uma estrada coberta de neve enquanto o gelo nos ramos das árvores brilha como castiçais e tilinta como se fadas tocassem pequenos sinos que abafam o som da neve a estalar debaixo dos passos é entrar num mundo á parte onde nem o ar frio incomoda.


Nevar é algo que me fascina para além da neve, é interno. Coincidência engraçada é que para além deste deslumbre que tenho pela neve, um dos apelidos que carrego é “das Neves”, segundo se diz de origem Italiana e religiosa. O que será que nos traz o ADN? Aquilo a que chamam de carga genética poderá incluir recordações codificadas? Aquilo a que chamamos “dejá vu” poderá ser uma memória genética que é descodificado por determinada vivência ou momento? Poderão ser transferidas através do tempo e explicar o facto de que ver nevar me tenha parecido tão familiar apesar de ser a primeira vez?


Adoro neve, mas o facto é que para além disso passear na neve traz-me calma como se estivesse em casa, como se fizesse parte de uma tradição interna que me tenha sido transmitida através desses códigos ainda por explicar. Hoje tive a honra e o prazer de estar em casa como já não estava há muito.

Lousã, 5 de Dezembro de 2020

Ano I de Covid19





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